Adeus, meus sonhos!

Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro!
Não levo da existência uma saudade!
E tanta vida que meu peito enchia
Morreu na minha triste mocidade!
Misérrimo! Votei meus pobres dias
À sina doida de um amor sem fruto,
E minh'alma na treva agora dorme
Como um olhar que a morte envolve em luto.
Que me resta, meu Deus?
Morra comigo
A estrela de meus cândidos amores,
Já não vejo no meu peito morto
Um punhado sequer de murchas flores!

Álvares de Azevedo

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Lágrimas da Vida

On pouvait à vingt ans le clouer dans la bière

— Cadavre sans illusions...
THÉOPH. GAUTIER

Je me suis assis en blasphémant sur le bord

du chemin. Et je me suis dit: — je n’irai pas plus
loin. Mais je suis bien jeune encore pour mourir,
n'est-ce pas, Jane?
GEORGE SAND, Aldo


Se tu souberas que lembrança amarga

Que pensamento desflorou meus dias,
Oh! tu não creras meu sorrir leviano,
Nem minhas insensatas alegrias!

Quando junto de ti eu sinto, às vezes,

Em doce enleio desvairar-me o siso,
Nos meus olhos incertos sinto lágrimas...
Mas da lágrima em troco eu temo um riso!

O meu peito era um templo — ergui nas aras

Tua imagem que a sombra perfumava...
Mas ah! emurcheceste as minhas flores!
Apagaste a ilusão que o aviventava!

E por te amar, por teu desdém, perdi-me...

Tresnoitei-me nas orgias macilento,
Brindei blasfemo ao vício e da minh’alma
Tentei me suicidar no esquecimento!

Como um corcel abate-se na sombra, 

A minha crença agoniza e desespera...
O peito e lira se estalaram juntos...
E morro sem ter tido primavera!

Como o perfume de uma flor aberta

Da manhã entre as nuvens se mistura,
A minh’alma podia em teus amores 
Como um anjo de Deus sonhar ventura!

Não peço o teu amor... eu quero apenas

A flor que beijas para a ter no seio...
E teus cabelos respirar medroso...
E a teus joelhos suspirar d’enleio!

E quando eu durmo... e o coração ainda

Procura na ilusão tua lembrança,
Anjo da vida passa nos meus sonhos
E meus lábios orvalha d’esperança!